Israel, Palestina e os Óscares

Os Óscares de 2013 marcaram uma mudança histórica no diálogo público sobre o conflito entre Israel e a Palestina. OPINIAO | 26 FEVEREIRO, 2013 – 09:22 | POR AMY...

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Os Óscares de 2013 marcaram uma mudança histórica no diálogo público sobre o conflito entre Israel e a Palestina.

OPINIAO | 26 FEVEREIRO, 2013 – 09:22 | POR AMY GOODMAN
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A cerimónia de entrega dos Óscares fará história este ano depois da nomeação pela primeira vez de um documentário realizado por um realizador palestiniano. “5 Broken Cameras” (“Cinco câmaras partidas”) foi filmado e dirigido por Emad Burnat, que vive na localidade de Bil’in nos territórios palestinianos ocupados da Cisjordânia, juntamente com o seu colega israelita Guy Davidi. Que vestirá um camponês palestiniano no tapete vermelho de Hollywood? Por pouco não saberíamos, já que Burnat, a sua esposa e o seu filho de 8 anos foram detidos no Aeroporto Internacional de Los Angeles, onde foram ameaçados com a deportação. Apesar de ter um convite formal da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas como realizador nomeado para o Óscar, Michael Moore, o documentarista vencedor do Óscar em 2012 e atual membro da junta diretiva de governadores da Academia, teve que intervir juntamente com os advogados da Academia para que Burnat e a sua família pudessem entrar nos Estados Unidos.

“5 Broken Cameras” compete aos Óscares com o documentário israelita “The Gatekeepers”, que mostra entrevistas a seis ex-diretores do Shin Bet, o serviço secreto de segurança interna de Israel, que é uma espécie de híbrido entre o FBI e a CIA dos Estados Unidos. No filme, os seis entrevistados condenam as atuais práticas israelitas de ocupação e de expansão de colonatos.

Trata-se de um caso notável da vida que imita à arte: enquanto as celebridades se reúnem para a maior gala cinematográfica do ano, o conflito entre Israel e a Palestina está a desenvolver-se nas ruas de Tinseltown.

Horas depois de recuperar a sua liberdade, Burnat emitiu uma declaração que dizia: “Ontem à noite, quando viajámos da Turquia para Los Angeles, Califórnia, a minha família e eu fomos detidos pelos serviços de imigração dos Estados Unidos durante quase uma hora. Interrogaram-nos sobre o propósito da nossa visita. Os funcionários dos serviços de imigração solicitaram-nos provas de que eu estava nomeado para os Prémios da Academia pelo documentário ‘5 Broken Cameras’ e disseram-me que se não pudesse provar o motivo da minha visita, a minha esposa Soraya, o meu filho Gibreel e eu seríamos enviados de regresso para a Turquia nesse mesmo dia”.

Emad Burnat conta: “Ontem, quando cheguei [aos Estados Unidos], interrogaram-me e pediram-me mais documentos e mais papéis. Tinha o visto, tinha os documentos e tinha o convite. Tinha tudo. No entanto, pediram-me que lhes desse mais documentos”. Na sua declaração escrita o cineasta Emad Burnat disse: “Depois de quarenta minutos de perguntas e respostas, Gibreel perguntou-me por que ainda estávamos a aguardar naquela pequena habitação. Disse-lhe a pura verdade: ‘Talvez tenhamos que regressar’. Pude sentir o seu pesar”. O nascimento de Gibreel em 2005 foi a motivação do filme. Emad Burnat adquiriu uma câmara nessa altura para filmar o crescimento do seu quarto filho. Naquele tempo, o governo de Israel tinha começado a construir o muro de separação ao longo de Bil’in, o que deu lugar a uma campanha de resistência não violenta por parte dos residentes palestinianos e de quem os apoiava. Enquanto Burnat filmava os protestos, uma a uma as suas câmaras foram destruídas ou danificadas pela violenta resposta do exército israelita e dos colonos israelitas armados.

Dror Moreh é o diretor israelita do documentário “The Gatekeepers”. Moreh disse-me: “Os colonatos são o maior obstáculo à paz. Se há algo que evitará a paz são os colonatos e os seus colonos. Acho que se trata do maior e mais influente grupo na política israelita. Basicamente têm ditado a política de Israel dos últimos anos. Acho que para os palestinianos os colonatos são definitivamente o pior inimigo para a conquista da sua pátria. Ao ver como crescem os colonatos por todo o lado como fungos depois da chuva, agora no área de Judeia e Samaria, veem como se reduz o seu país”.

Tanto “5 Broken Cameras” como “The Gatekeepers” competem aos Óscares com outros pesos pesados como “Como sobreviver a uma praga”, sobre a epidemia da SIDA; “A guerra invisível”, a respeito da violação endémica e impune nas forças armadas norte-americanas; e “Searching for Sugar Man”*, a respeito da reaparição de um músico que há tempo se pensava que tinha morrido.

Emad Burnat terminou a declaração sobre a sua detenção no Aeroporto Internacional de Los Angeles: “Apesar de ter sido uma experiência desagradável, isto ocorre diariamente aos palestinianos, na Cisjordânia. Há mais de 500 postos de controle israelitas, estradas bloqueadas e outras barreiras à livre circulação nos nossos territórios e todos temos sofrido a experiência que a minha família e eu experimentámos ontem. O nosso caso foi apenas um pequeno exemplo do que os palestinianos têm que suportar diariamente”.

Independentemente de qual seja o documentário vencedor, os Óscares de 2013 marcarão uma mudança histórica no diálogo público sobre o conflito entre Israel e a Palestina, uma mudança adiada durante muito tempo da qual serão testemunhas 40 milhões de telespectadores.

Artigo publicado em “Democracy Now” em 21 de fevereiro de 2013. Denis Moynihan colaborou na produção jornalística desta coluna. Texto em inglês traduzido por Mercedes Camps para espanhol. Traduçãopara português de Carlos Santos para Esquerda.net

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